Elogio ao papel branco


 
          (carta a Lysias Enio)
      parágrafo 

      tenso obscuro puntiforme conclusivo

       ponto

       invoco a sabedoria, deusa escrevente

       e desafio para a invernada rumo ao labirinto

       de minhas idéias. ainda não definidas. 

      Como dizer ao papel branco

       o que receber de imagens pictóricas, 

      garranchos neuróticos

       que o arranham e dilaceram de forma irônica? 

      Tantas vezes falando muito, 

      tantas vezes dizendo nada. 

      A arte desta relação consiste

       na luta entre resistências. 

      De um lado o papel indefeso e imaculado, 

      submisso à tirania do vate que o açoita

       com tintas e rabiscos. 

      De outro, o próprio tolo, que expõe a esmo

       o ridículo da palavra mal dita, 

      na punição do tempo que torna suas idéias, 

      motivo de esquecimento. 

      Apenas o papel sobrevive, 

      branco e imaculado. 

      Portanto, amigo, 

      tantas quantas forem as palavras, 

      inauditas por sua própria natureza apenas estética, 

      mais difícil chegar-se ao algo de dado assunto. 

      Especialmente quando referendam crendices, 

      sonhos e poesia. 

      Parágrafo, 

      ponto morto na descida da ladeira, 

      sem freios. 

      A grande viagem só se inicia, quando se consente vertigens, soslaio de olhares lascivos, imagens impossíveis, ruídos estrepitosos, amores tensos, improváveis, medo e alegria, romances insustentáveis. 

      Então, amigo, 

      que fazer se não consigo

       sair do parágrafo, 

      tenso obscuro puntiforme conclusivo? 

      ponto. 
       
       
       
       

Vito Cesar 


 

 
 
 

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