Aquele que dói





    - Diz lá, quem és e a que veio :

    Sou aquele que dói, na sombra do açoite,

    No lanho suado do alvoroço, na calada da noite.

    Sou o braço do golpe e a ponta da espada,

    Aquele que, acoitado no arbusto,

    Na total solidão do medo,

    Arremete com um gesto toda a passarada,

    Total revoada de sons e segredos.

    Sou um tal que incomoda em silêncio,

    O arbítrio dos fortes, a união dos humildes,

    A ilusão do sagrado, a sagração do profano.

    Sou um que não existe, para a ventura dos loucos,

    Para o sonho dos puros, para a neurose dos sãos.

    Sou um ponto na linha, fechando as idéias,

    Um rompante, uma luz, uma orquídea bizarra.

    Vim do norte, da rosa dos ventos, da voz dos aflitos,

    Da paixão dos sedentos,

    Vim de Minas e de Angola,Paranambucaníssimanente,

    Dos campos do Rio Grande, das dunas do sacro Saara,

    Das velas do Mucuripe, Abaetés e mirim,

    As vozes do mundo todo, ecoam dentro de mim,

    Vim gaiola de escravo, doença de branco e mulato,

    Carrego dentro do fardo, histórias que não tem fim.

    Venho pedir meu assento, na convivência dos mitos,

    Doar o meu corpo, minh’alma e ciência,

    A todos os homens ilustres,

    Que venham a mim os abutres, do total conhecimento,

    De lendas, histórias, momentos,

    Tenho comigo uma arma, de valor e esquecimento,

    Uma palavra velada, uma luz no firmamento,

    Coisa que chamo verdade,

    A tantos, mero divertimento.


Vito Cesar

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